TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.112 - Disponibilização: segunda-feira, 6 de junho de 2022
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Consumada a conduta delitiva, surge a pretensão punitiva estatal (jus puniendi), que deve ser exercida dentro de prazo regrado
pelo Código Penal, proporcional à pena cominada ao crime. A incapacidade de processar e julgar o agente dentro do prazo fixado
em lei, para, ao final, em caso de condenação, puni-lo, tem como consequência a extinção da pretensão sancionatória.
Dentro das modalidades da prescrição punitiva há a retroativa, que, conforme dicção do art. 110 do Código Penal, ocorre quando,
com base na pena concretamente aplicada, entre o recebimento da denúncia e a sentença condenatória transcorrera lapso temporal superior aos prazos previstos no art. 109 do referido Diploma Legal. Assim, se antes da pena aplicada o prazo prescricional
tinha por norte a pena máxima cominada ao crime (pena em abstrato), com o quantum da pena definido (pena em concreto), este
passa a servir parâmetro para averiguação da prescrição.
Com base na prescrição retroativa, construiu-se a tese da prescrição em perspectiva – também nominada de antecipada, projetada ou virtual – que se assenta numa projeção da sanção a ser imposta ao réu, numa possível condenação, ante a análise
antecipada dos critérios previstos em lei para aplicação da pena. Esta teoria é alicerçada pelos princípios da razoabilidade, da
economia processual e da dignidade da pessoa. Em suma, apregoa-se ser desarrazoado dar prosseguimento a uma ação cujo
interesse de agir (utilidade) não mais viceja, pois da práxis judicante pode se concluir que a pena presumida não seria executada,
por ter sido alcançada pela prescrição retroativa. Entende-se, ainda, que o prosseguimento de uma ação penal inócua traria efeitos nocivos ao réu, que arca com seus ônus sociais e pecuniários, bem assim para o Estado e a sociedade como um todo, pois
seriam despendidos recursos materiais e humanos que poderiam ser melhor empregados em ações de que terão efetividade.
Nas palavras de Cleber Masson1:
Não existiria utilidade na ação penal, pois irremediavelmente ocorreria a prescrição retroativa, tornando inócuo o seu emprego.
Ademais, seria despropositado gastar tempo dos operadores da Justiça, e, principalmente, dinheiro público, com um processo
penal fadado a ter reconhecida a extinção da punibilidade.
De resto, impende reconhecer que a finalidade da pena é irreparavelmente fulminada com o transcurso de largo lapso temporal,
quer seja ela em sua perspectiva preventiva geral, pois os efeitos grassados com uma condenação tardia não têm a repercussão
pretendida para a comunidade que teve notícia quando da consumação do crime: os efeitos persuasivos e repressivos da pena
dissipam-se com o tempo; que seja em sua perspectiva de prevenção especial, haja vista que, muitas vezes, o prosseguimento
de feito que não trará condenação exequível, ao impor ao acusado o ônus de suportar a angustia e os custos, sociais e financeiros, o relegá à marginalização comumente vivenciada pelos processados criminalmente.
Nesse diapasão, por comungar do entendimento doutrinário exposto e por considerar ser necessário zelar pela racionalização
dos serviços judiciário e pela otimização da combalida máquina judiciária, hei por bem aplicar ao caso vertente o instituto da
prescrição em perspectiva, para declarar extinta a pretensão punitiva, posto que, em caso de condenação, considerando que a
maioria das circunstâncias judiciais são favoráveis ao Denunciado, bem assim que milita em seu favor a incidência da atenuante
prevista no art. 65, I, do CP, a pena projetada não seria superior a 12 (doze) anos. Com base nessa provável pena e considerando que o Réu possuía idade inferior a 21 (vinte e um) anos à época dos fatos, o Estado teria o prazo de 8 (oito) anos para fazer
valer a sua pretensão de punir, conforme art. 109, II, c/c o art. 115, ambos do Código Penal. Ocorre que já se passaram mais de
08 (oito) anos desde o recebimento da denúncia. Logo, vê-se que estes autos espelham exemplo cristalino de processo que não
alcançará resultado útil, sendo necessária, portanto, a declaração da prescrição antecipada ou virtual para que o judiciário utilize
sua energia para julgar causas que venham a alcançar resultado útil.
3. DISPOSITIVO
Ante ao exposto:
3.1. forte nos artigos 5º, LIV, da Constituição Federal e 251 do Código de Processo Penal, CHAMO O FEITO À ORDEM, para
declarar nula a citação editalícia de Id. Num. 158502186 e a suspensão do processo e do prazo prescricional determinado na
decisão de Id. Num. Id. Num. 158502189
3.2. com arrimo no art. 107, IV c/c os artigos 109, II, 110 e 115, todos do Código Penal, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE
do denunciado JACKSON MOREIRA BARRETO, brasileiro, nascido em 13/03/1994, filho de Silvaneide Moreira Barreto, RG:
20757986-56 SSP/BA, pelo advento da prescrição da pretensão punitiva do Estado.
Publique-se. Intimem-se. Ciência ao MP.
Transcorrido o prazo recursal, certifique-se, comunique-se ao CEDEP e dê-se baixa na distribuição.
Irecê/BA, 24 de março de 2022.
RUY JOSÉ AMARAL ADÃES JÚNIOR
Juiz de Direito
1MASSON, Cleber. Direito Penal: Parte Geral (arts. 1º a 120). 14. ed. rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
MÉTODO, 2020. v. 1, p. 836.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª VARA DOS FEITOS CRIMINAIS, JÚRI E EXECUÇÕES PENAIS DA COMARCA DE IRECÊ
SENTENÇA
0006856-67.2016.8.05.0110 Ação Penal - Procedimento Ordinário
Jurisdição: Irecê
Reu: Junior Cesar Charneski
Vitima: Iago Souza Ramos
Terceiro Interessado: Sd Pm Uenes De Araujo
Terceiro Interessado: Sd Pm Henrique Barbosa De Araujo
Autor: Ministério Público Do Estado Da Bahia