TJPA - DIÁRIO DA JUSTIÇA - Edição nº 7195/2021 - Segunda-feira, 2 de Agosto de 2021
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confirmasse o tráfico de drogas. O réu negou em juÃ-zo o tráfico e na delegacia usou o direito ao
silêncio. Os policiais não o flagraram vendendo a droga, nem encontraram nada que confirmasse o
tráfico na revista domiciliar feita logo após a abordagem. Os pais do réu confirmaram que nada foi
encontrado na revista domiciliar.          Não desmerecendo o trabalho dos respeitáveis
policiais militares, mas decerto é o Estado quem tem o dever legal de apresentar provas robustas para
uma condenação, que não deixam dúvidas, e para tanto deve ser apurada com mais afinco a autoria
e materialidade do crime.          Deste modo, é perfectÃ-vel a dúvida quanto Ã
materialidade delitiva do crime de tráfico de drogas.           O crime não se presume,
prova-se, demonstra-se. Do contrário, como já ressaltado alhures, estar-se-ia a condenar uma pessoa
levianamente, sem prova suficiente da conduta criminosa a ela imputada. 0Â Â Â Â Â Neste sentido, me
cumpre mencionar que as diretrizes acima analisadas são exatamente as constantes da Lei nº
11343/06 para configuração ou não da destinação da droga para uso pessoal: 1     Art. 28.
(...) 2     (...) 3     § 2º Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz
atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se
desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes
do agente.          Quanto ao local em que foi apreendido, também não há notÃ-cias de ser
local de tráfico de drogas, e ainda que fosse, é lógico que onde se venda drogas, também se
compre, de forma que ponto de venda de drogas obviamente tem que ser frequentado por vendedores e
compradores/usuários, pois sem procura não há oferta.          Pelo exposto, entendo não
haver provas de que o réu praticou o delito de tráfico de drogas, como que visando ao seu comércio.
         Neste sentido, conforme doutrina mais abalizada e jurisprudência dos Tribunais
Superiores, o Juiz não está adstrito à capitulação provisória feita pelo Ministério Público,
podendo, assim, dela desgarrar-se e invocar o princÃ-pio narra mihi factum dabo tibi ius. Â Â Â Â Â Â Â Â Â
Devo salientar, também, que ao proceder dessa forma (atribuindo nova definição jurÃ-dica ao fato ¿
ememdatio libelli), não há qualquer atentado aos princÃ-pios da ampla defesa, do contraditório e o ne
procedat iudex ex officio, princÃ-pios esses corolários do sistema acusatório.          Desse
modo, verifica-se que tal instituto visa tão somente corrigir uma capitulação equivocada. Com isso, no
caso concreto e diante das provas de materialidade e autoria entendo que o caso é de
desclassificação do delito de tráfico para consumo de entorpecentes. Neste sentido é o
entendimento da jurisprudência: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
TRÃFICO DE DROGAS. DESCLASSIFICAÃÃO. EXCEPCIONALIDADE. AUSÃNCIA DE PROVAS
CONCLUSIVAS ACERCA DO NARCOTRÃFICO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Ã
entendimento pacÃ-fico da jurisprudência ¿ tanto deste Superior Tribunal quanto do Supremo Tribunal
Federal ¿ de que a pretensão de desclassificação de um delito exige, em regra, o revolvimento do
conjunto fático-probatório produzido nos autos, providência incabÃ-vel, em princÃ-pio, em recurso
especial, consoante o enunciado na Súmula n. 7 do STJ. 2. No caso, embora o réu haja sido preso em
flagrante em local conhecido por intenso tráfico de drogas, ele, em nenhum momento, foi pego vendendo,
expondo à venda ou oferecendo drogas a terceiros (aliás, nem vendendo, nem comprando drogas); ou
seja, ele não foi encontrado, na rua, em situação de traficância. Também não se tratava de
averiguação de denúncia robusta e atual acerca da prática de tráfico de drogas pelo recorrente;
não houve, ainda, uma investigação anterior que apontasse o réu como traficante. Apenas houve a
apreensão de pequena quantidade de drogas em seu poder (12,89 gramas de cocaÃ-na). De outro lado,
a própria defesa não negou a propriedade da droga, afirmando, no entanto, que era para consumo
próprio. Ainda, mas não menos importante, vale o registro que o réu, ao tempo do delito, era
tecnicamente primário e possuidor de bons antecedentes. 3. A conclusão das instâncias de origem (e
do próprio Ministério Público Federal) de que o réu seria traficante pelo simples local em que foi
preso em flagrante ¿ em bairro conhecido por intenso tráfico de drogas ¿ foi firmada com base apenas
em indÃ-cio de que ele seria traficante de drogas, e não em elementos robustos e conclusivos de que
estaria havendo a prática do crime de tráfico. Vale dizer, o que se tem dos elementos coligidos aos autos
é apenas a intuição acerca de eventual traficância praticada pelo agravado. Somente aliado a outros
meios de prova é que o local da abordagem do réu poderia basear o convencimento do juiz acerca da
traficância. Não há, pois, como subsistir a conclusão de que houve a prática do crime de tráfico de
drogas. 4. Nada impede que um portador de 12 gramas de cocaÃ-na, a depender das peculiaridades do
caso concreto, seja um traficante, travestido de usuário, ocasião em que, "desmascarado" pelas provas
efetivamente produzidas ao longo da instrução criminal, deverá ser assim condenado. No entanto, na
espécie ora em análise, a apreensão de apenas essa quantidade de drogas e a ausência de
diligências investigatórias que apontem, de maneira inequÃ-voca, para a narcotraficância evidenciam
ser totalmente descabida a condenação pelo delito previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, o