Disponibilização: quinta-feira, 11 de janeiro de 2018
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Capital
São Paulo, Ano XI - Edição 2495
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desde 02/01/2013, mas existem moradores que residem no local há mais de 20 anos, como o sr. José da Silva. Alegam em
preliminar inépcia da inicial, falta de interesse de agir, necessidade de intervenção do Ministério Público, denunciação da lide ao
Estado e ao Município. No mérito, alegam que a 24 anos a autora não utilizou a área para os fins que a reservou, ou seja, não
construiu a área de lazer, deixando a área ociosa e que muito provavelmente continuará ociosa. Requer expedição de ofício a
SEHAB solicitando o atendimento habitacional provisório das famílias; requer a suspensão da decisão até o proprietário fornecer
os meios para a reintegração, e que seja reconhecido o direito de retenção e de indenização pelas benfeitoriasHouve réplica
(fls.665/729, 740/766).Em audiência de conciliação, houve o pedido de suspensão do andamento do feito com designação de
nova audiência para o dia 15/04/2016 (fls.1201/1203).Fls.1358: Ministério Público, deixa de intervir nos autos.Audiência de
conciliação novamente redesiganda a fls. 1535/1537. Tendo em vista a possibilidade acordo, mantiveram a suspensão do feito
até 22/08/2016 (fls.1545/1546).Mandado de reintegração de posse cumprido a fls.1633/1636.É o relatório. Fundamento e decido.
Conheço diretamente do pedido, na forma do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, porquanto a questão de mérito é
exclusivamente de direito.Afasto as preliminares suscitadas.Inicialmente, afasta-se a preliminar de inépcia da inicial suscitada,
pois estão presentes todos os requisitos previstos pelos artigos 319 e 320, ambos do Código de Processo Civil. Os fatos foram
narrados de forma clara, acompanhando a exordial os documentos entendidos como essenciais ao deslinde da demanda. Isso
permitiu o regular exercício do contraditório e da ampla defesa pelas demandadas, que puderam corretamente formalizar sua
peça contestatória.Quanto ao interesse processual, está presente sempre que a parte tenha a necessidade de exercer o direito
de ação (e, consequentemente, instaurar o processo) para alcançar o resultado que pretende, relativamente à sua pretensão e,
ainda mais, sempre que aquilo que se pede no processo (pedido) seja útil sob o aspecto prático.No caso dos autos, está
evidenciada a necessidade do exercício do direito de ação.Quanto ao mérito, a ação deve ser julgada procedente.Tratando-se
de ação de reintegração de posse, incumbe à autora demonstrar, de acordo com o artigo 560 do Código de Processo Civil, a sua
posse, a turbação ou o esbulho praticado pela parte requerida e a data do esbulho.A parte autora, de fato, desincumbiu-se de
seu ônus probatório.Como é cediço, os bens públicos não são passíveis de gerar direito à posse ao particular. Sua ocupação
configura mera detenção. Ou seja, não há direito algum do particular que ocupa bem público, seja de permanecer no local, seja
de ser indenizado por eventuais benfeitorias.Na hipótese dos autos, embora a CDHU, de fato, seja sociedade de economia
mista, não se pode ignorar que a sua finalidade é o exercício de atividade pública, qual seja, a construção de moradias para
pessoas de baixa renda familiar.Dessa forma, seus bens, ainda que dominicais ajustam se à finalidade social, pouco importando
a classificação jurídica que lhes é emprestada, pois detentores de destinação especial legalmente garantida.Nesse sentido:
“USUCAPIÃO. Bem público. Área pertencente à CDHU. Empresa de economia mista, com capital formado com recursos
públicos. Impossibilidade do pedido de usucapião. Sentença de improcedência. Recurso desprovido” (Apelação nº 000031670.2011.8.26.0311, Rel. Des. Teixeira Leite).No caso, ficou bem demonstrado que a área ocupada pelos requeridos é de
propriedade da CDHU e, da mesma forma, o esbulho ficou devidamente caracterizado, visto que os próprios requeridos admitem
a ocupação da área, embora insistam na sua boa-fé.Entretanto, ainda que os requeridos ocupem a área há vários anos e de
boa-fé, sem que houvesse, até então, contrariedade manifestada, tal situação não é capaz de lhes gerar quaisquer direitos.Isso
porque, nos termos do art. 183, §3º, da Constituição Federal, “Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião”.Portanto,
a ocupação de bem público configura mera detenção e não posse. Ou seja, não há direito algum do particular que ocupa esse
bem, seja de permanecer no local, seja de ser indenizado por eventuais benfeitorias.A propósito, nos termos da Súmula 340 do
Eg. Supremo Tribunal Federal: “Desde a vigência do Código Civil [DE 1916], os bens dominicais, como os demais bens públicos,
não podem ser adquiridos por usucapião.”Assim, uma vez caracterizado o esbulho da área pública, é devida a reintegração de
posse, de modo que o pedido contraposto é mesmo procedente.Nessa linha, é o posicionamento do Egrégio Tribunal, em casos
semelhantes:Apelação Cível Possessória. Processual Civil Reexame necessário Condenação de valor ilíquido Sentença sujeita
ao duplo grau de jurisdição Inteligência do art. 496, § 3º, CPC Recurso oficial considerado interposto. Reintegração de posse
Esbulho Área remanescente de conjunto habitacional, reservada a instalação de sistema de lazer e área verde non aedificandi
pertencente à área maior pertencente a CDHU, sociedade de economia mista prestadora de serviço público Bem afetado à
finalidade de prestação de serviço público de entidade estatal Natureza de bem público, insuscetível de usucapião e perda por
abandono Legítima a posse da requerente sobre a área objeto da pretensão Esbulho caracterizado Mera detenção com natureza
de posse precária, não gerando qualquer direito, inclusive à indenização por benfeitorias ou acessões introduzidas na área
esbulhada Concessão de uso especial para fins de moradia Inadmissibilidade Descumprimento dos requisitos exigidos no art. 1º
da MP nº 2.220/01 Sentença reformada Recurso e remessa oficial providos para julgar procedente o pedido. Dáse provimento
ao recurso e à remessa oficial, considerada interposta. (Apelação nº 0024473-57.2001.8.26.0053. Rel. Des. Ricardo Anafe. 13ª
Câmara de Direito Público. j. 20/09/2017)Reintegração de Posse Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do
Estado de São Paulo CDHU Imóvel destinado a programa habitacional popular, ocupado irregularmente pela requerida Natureza
pública do bem, nos termos da Lei Estadual Lei Estadual nº 6.756/1990 Impossibilidade de aquisição pela usucapião Pleito de
reconhecimento do direito subjetivo à concessão de uso especial para fins de moradia (CUEM) Impossibilidade Constitucionalidade
da limitação temporal prevista pela Medida Provisória n.º 2.220/2001 Norma reconhecida como constitucional pelo C. Órgão
Especial, ainda que sob outro enfoque, nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade n.º 0041454-43.2012.8.26.0000
Ocupação que supostamente data do ano de 2003, após o marco temporal previsto na r. Medida Provisória Esbulho caracterizado
Sentença de procedência Recurso desprovido. (Apelação nº 0008007-15.2013.8.26.0005. Rel. Des. Luciana Bresciani. 2ª
Câmara de Direito Público. j. 30/05/2017)Verifica-se, assim, que os fatos relatados na inicial restaram devidamente comprovados,
no tocante à posse exercida pela parte autora.Observo que o parágrafo único do artigo 1.201 do Código Civil, ao estabelecer
que se presume a boa-fé do possuidor com justo título, não afasta a possibilidade de reconhecimento da boa-fé do possuidor
que não apresenta justo título.Neste sentido:”Nos termos do artigo 1.201 do Código Civil, a existência de justo título instaura a
presunção de que a posse é exercida de boa-fé, mas a sua falta, ao contrário, não autoriza a conclusão de que há má-fé. Com
efeito, para que a posse seja considerada de boa-fé, basta que o possuidor ignore a existência de obstáculo legal à aquisição da
coisa” (STJ-RP 189/380: 3ª T., REsp 855.040).E as circunstâncias pelas quais a autor exerce a posse, indica que a posse havia
sido adquirida de forma justa, pois nunca houve reclamos contra a sua posse.Ressalte-se que resta claro nos autos a maneira
pela qual a parte requerida ingressou no imóvel, bem como que não têm qualquer documento de aquisição da posse apto à
caracterização de justo título, ou seja, a posse foi adquirida de forma injusta, clandestina ou precária, de maneira que se pode
afirmar que a posse da parte requerida é de má-fé, o que acarreta no direito do possuidor esbulhado de reaver a posse.Assim,
as rés invadiram o imóvel em relação ao qual a parte autora exercia a posse. Ressalto que os requeridos não produziram
qualquer prova no sentido de que receberam a posse da área de forma legítima.Frise-se que, sendo invasores, os réus são
possuidores de má-fé e não possuem o direito à indenização por benfeitorias ou ao exercício do direito de retenção. Por fim,
observo que eventual descumprimento da função social do imóvel é questão que deve ser solucionada pelas vias próprias.
Assim, outra solução não resta senão a procedência da ação.Posto isso e considerando o mais que dos autos consta, JULGO
PROCEDENTE, para tornar definitiva a liminar e determinar a reintegração da autora na posse do imóvel descrito na inicial.
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º