No Id 16894942, os requeridos informaram que o CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) julgou procedente recurso administrativo interposto no PA n. 19515.720270/2017-15, para cancelar a autuação em
relação a Comercial Marisol de Brodowski LTDA, Amaury Pedro Jorge e Outros e Metas Representações Comerciais LTDA-ME, requerendo a extinção deste feito em relação a eles, na forma do art. 485, VI, do CPC.
Juntaram a decisão administrativa (Id 16894944).
Intimada, a Fazenda Nacional afirmou que a referida decisão administrativa não é definitiva; que existe outro crédito tributário controlado no processo 19515.720.301/2017-38, com recurso voluntário pendente de julgamento;
e a absoluta inocuidade daquele julgamento perante a presente medida cautelar fiscal, cujo desiderato é apreender bens e direitos da contribuinte Cerealista Marisol Ltda e dos responsáveis mantidos, Amaury Pedro Jorge,
Marcos Roberto Jorge e Merched Jorge, de forma que os bens integralizados por eles no capital social da pessoa jurídica poderiam ser alvos de medida cautelar. Aduziu, ainda, que a empresa Amaury Pedro Jorge e Outros
constitui empresa individual sem distinção de personalidade jurídica do empresário de idêntico nome, cuja responsabilidade foi preservada (Ids 17921503 e 17965337).
É o relatório.
Passo a decidir.
De início, afasto a preliminar de inépcia da inicial, por não conter os documentos necessários para a propositura da ação, na forma dos artigos 320 e 330, I, do CPC c/c artigo 3º da Lei n. 8.397/92, em face da alegação de
inexistência prova literal da constituição do crédito, haja vista que os créditos tributários foram constituídos por lançamentos de ofício consubstanciados em autos de infração, conforme documentos anexados aos autos (fls.
182/183, 197/199, 213/215, 229/231, 245/247, 261/263, 277/279 e 329 do Id 13292260; fls. 197/199 do Id 13292856).
Afasto, também, a preliminar de litigância de má-fé fundamentada na alegação de que a requerente altera a verdade dos fatos quanto ao recurso administrativo que suspendeu a exigibilidade dos débitos cobrados e ao
cancelamento de parte do débito de IRRF, tendo em vista que a Lei n. 8.397/92 permite o ajuizamento da medida cautelar fiscal mesmo em casos de suspensão da exigibilidade do crédito tributário.
Quanto à ausência de informação do COAF acerca de movimentação financeira atípica dos requeridos desde fevereiro/2015, já que o Relatório de Inteligência Financeira – RIF somente poderia ser obtido por meio de
cadastro e acesso deste magistrado no Sistema Eletrônico de Intercâmbio-SEI-C (Ids 14079066 e 15713948), anoto que a Fazenda Nacional, na réplica (Id 16138312), requereu a procedência da medida cautelar fiscal,
confirmando-se a liminar deferida, indicando estar satisfeita com a produção de provas já havidas nos autos.
Desse modo, considerando que a prova produzida nestes autos é suficiente para a análise dos fatos alegados, entendo desnecessária a produção de prova no COAF.
Passo a analisar o mérito da cautelar fiscal.
A ação cautelar incidental objetiva assegurar a possibilidade de êxito em ação de cobrança ante o fundado receio da dissipação de patrimônio ou de valor que, em tese, poderia garantir a dívida.
Os requeridos sofreram autuações fiscais decorrentes da omissão de receitas apurada nos procedimentos administrativos ns. 19515.720.270/2017-15 e 19515.720.301/2017-38 (Id 13292260), que englobam os tributos de
IRPJ, CSLL, PIS e COFINS e IRRF sobre pagamentos sem causa ou de operação não comprovada, cuja soma alcançou o valor de R$ 55.674.182,27, em 04/2017.
Quanto à alegação de que a existência de suspensão da exigibilidade do crédito tributário discutido nos autos dos processos administrativos 19515-720.270.2017-15 e 19515-720.2070/2017-15, em virtude da interposição
de recurso administrativo (art. 151, III, do CTN), seria fato impeditivo para o ajuizamento desta ação, saliento que o fundamento inicial para o processamento desta cautelar fiscal centra-se na hipótese do art. 2º, VI, da Lei n.
8.397/92, quando o sujeito passivo do crédito tributário possui débitos, inscritos ou não em dívida ativa, que somados ultrapassem 30% (trinta por cento) do seu patrimônio conhecido.
Apesar de os créditos tributários não estarem definitivamente constituídos por força das impugnações administrativas, entendo que a melhor interpretação do art. 1º c/c art. 3º, I, ambos da Lei n. 8.397/92, é a de que a
suspensão da exigibilidade do crédito tributário não tem o condão de impedir o processamento da cautelar fiscal, mormente pelo fato de que tal medida urgente visa impedir o risco de esvaziamento patrimonial dos devedores,
resguardando bens para penhora em futura execução fiscal.
Nesse ponto, cabe salientar que houve uma diminuição no patrimônio conhecido da contribuinte principal Cerealista Marisol Ltda, que, em 31/12/2015, era equivalente a R$773.860,96, e, posteriormente, conforme apurado
no processo administrativo de arrolamento n. 19515.720362/2017-03, atingia o valor de R$ 279.004,00.
Outrossim, o artigo 11 da Lei n. 8.397/92 assevera que, no caso de procedimento preparatório, “deverá a Fazenda Pública propor a execução judicial da Dívida Ativa no prazo de sessenta dias, contados da data em que a
exigência se tornar irrecorrível na esfera administrativa”. Logo, parece-me que enquanto a medida não for irrecorrível na esfera administrativa, quando o crédito tributário não estiver definitivamente constituído, é possível o
ajuizamento da medida, não havendo sentido a expressa menção da lei quanto à irrecorribilidade se não permitisse o ajuizamento quando não definitivo o crédito tributário.
Nessa mesma linha, o artigo 12 da referida Lei, no seu parágrafo único, assenta que “salvo decisão em contrário, a medida cautelar fiscal conservará sua eficácia durante o período de suspensão do crédito tributário ou não
tributário”, não havendo distinção quanto à permissão de continuidade no processamento de feitos em que se verifica causa de suspensão de exigibilidade do(s) crédito(s) tributário(s), anterior ou posterior ao ajuizamento. Nesse
sentido:
EMENTA:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR FISCAL. LEI 8.397/1992, ARTIGO 2º, INCISOS III, V, B, VII E IX. POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO EM FACE DE QUEM
NÃO CONSTOU DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. DÉBITOS ALEGADOS DE MAIS SETENTA E TRÊS MILHÕES DE REAIS. DETALHADO RELATÓRIO DE
FISCALIZAÇÃO. INDÍCIOS DE PRÁTICA DE ATOS COM INTUITO DE FRUSTRAR A SATISFAÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO E CONFUSÃO PATRIMONIAL, POR MEIO
DE ATUAÇÃO PESSOAL DOS ADMINISTRADORES. CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE VOLTADA EM TESE À BLINDAGEM PATRIMONIAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO
SIGILO BANCÁRIO E FISCAL. INDISPONIBILIDADE DE ATIVOS FINANCEIROS. MEDIDA EXCEPCIONAL. CABIMENTO NA HIPÓTESE DOS AUTOS. RECURSO
DESPROVIDO.
1. A circunstância de não constar no processo administrativo não impede que a pessoa tenha contra si ajuizada a presente medida cautelar fiscal. O “ art. 4º, §2º, da Lei n. 8.397/92, autoriza o requerimento da medida cautelar
fiscal contra terceiros, desde que tenham adquirido bens do sujeito passivo (contribuinte ou responsável) em condições que sejam capazes de frustrar a satisfação do crédito pretendido” (REsp 962.023/DF, Rel. Ministro
MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 16/03/2012).
2. Não é pressuposto da medida cautelar fiscal, proposta com fundamento no artigo 2º, inciso VI, da Lei nº 8.397/1992, que o crédito esteja constituído definitivamente. Para as ações que têm como finalidade o acautelamento,
não é necessário que se encontre o crédito exigível, apenas que haja prova literal da dívida líquida e certa e prova documental de uma das hipóteses mencionadas no artigo 2º da Lei nº 8.397/1992. Desnecessário o exaurimento
do litígio administrativo, com a definitividade do crédito tributário, para fim de ajuizamento da cautelar fiscal, pois eventual causa suspensiva dos débitos não afasta a possibilidade da medida.
3. A fiscalização tributária promoveu ampla inspeção envolvendo as pessoas jurídicas e naturais que compõem o polo passivo, analisando documentação contábil, movimentação financeira, contratos e outros documentos
tributários, concluindo pela existência de simulações, unidade gerencial e confusão patrimonial com objetivo de lesar o pagamento dos tributos.
...
9. Quanto à extensão da medida decretada, deve-se ter em vista que, embora o aludido dispositivo disponha que somente pode a indisponibilidade recair sobre bens do ativo permanente, o STJ possui entendimento consolidado
no sentido de excepcionar tal regra na hipótese de não serem localizados bens em nome do devedor suficientes para garantir a futura execução dos créditos tributários (AgInt no REsp 1584620/SC, Rel. Ministro MAURO
CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/06/2016, DJe 28/06/2016).
10. Qualquer alegação de exagero em valores e bens indisponibilizados, a ser submetida evidentemente ao prévio crivo do contraditório, deve ser apreciada pelo Juízo a quo, sob pena de supressão de instância, já que isto não é
objeto da decisão agravada.
11. Recurso desprovido.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5022250-87.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, e - DJF3 de 09/05/2019).
No tocante ao valor de cada bem considerado no arrolamento, que levou em conta o valor informado nas declarações de imposto de renda, ressalto que o art. 64, §2º, da Lei n. 9.532/98, estabelece que “na falta de outros
elementos indicativos, considera-se patrimônio conhecido, o valor constante da última declaração de rendimentos apresentada.” Dessa forma, não havendo outros elementos indicativos de valor nos autos, exceto avaliações
particulares trazidas com a contestação, não há que se falar em irregularidade nos valores dos bens apontados no arrolamento pela Fazenda Nacional.
Anoto que as avaliações particulares trazidas aos autos (Id 13848527) são documentos produzidos unilateralmente pela parte, sem descrição detalhada dos imóveis ou outro documento que as corroborem, de modo que não
têm o condão de afastar o valor outrora indicado pela parte requerida. Anoto, ainda, que mesmo se considerada as avaliações particulares, a soma dos valores dos bens alcançaria a casa dos R$ 27.000.000,00, valor inferior ao
do crédito tributário que se pretende garantir em futura(s) execução(ões) fiscal(is). Assim, somente com a efetivação de penhoras e respectivas avaliações dos imóveis por oficial de justiça, é que seria possível aferir-se os reais
valores dos bens indisponibilizados.
No tocante à questão da legitimidade passiva da contribuinte principal Cerealista Marisol LTDA e dos requeridos Comercial Marisol de Brodowski Ltda ME, Amaury Pedro Jorge e Outros, Metas Representações
Comerciais Ltda ME, Merched Jorge, Marcos Roberto Jorge e Amaury Pedro Jorge, anoto que os fundamentos dessa responsabilidade tributária encontram-se descritos na representação fiscal no Auto de Infração (pp. 2-27
do Id 13292260) e demais documentos acostados aos processos administrativos fiscais, conforme descrevo a seguir.
O quadro societário da pessoa jurídica Nutrigrãos era composto pelos sócios Adeildo Leite da Silva e Samuel Jovanhaque a partir da alteração realizada em 01/08/2011, os quais não responderam às intimações fiscais.
Durante a tramitação do processo administrativo fiscal foi constatado por auditoria efetuada, que esses sócios eram interpostas pessoas, não localizadas, sem qualquer participação efetiva nas atividades da empresa e que não
possuíam patrimônio para integralização do capital social da sociedade Nutrigrãos, haja vista que as DIRPFs eram incompatíveis com o faturamento da sociedade. Tais pessoas, utilizadas como “laranjas”, não tinham
capacidade econômica para a integralização patrimonial, não havendo indícios de que praticavam a atividade empresarial em nome da gerência nem exerciam poderes de administração, uma vez que não auferiam qualquer lucro
das atividades realizadas pela pessoa jurídica.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 16/12/2020 263/1496